domingo, 29 de junho de 2014

TEXTO E REFLEXÃO - "O MODELO DOS MODELOS"

O modelo dos modelos”
Italo Calvino
Houve na vida do senhor Palomar uma época em que sua regra era esta: primeiro, construir um modelo na mente, o mais perfeito, lógico, geométrico possível; segundo, verificar se tal modelo se adapta aos casos práticos observáveis na experiência; terceiro, proceder às correções necessárias para que modelo e realidade coincidam. [..] Mas se por um instante ele deixava de fixar a harmoniosa figura geométrica desenhada no céu dos modelos ideais, saltava a seus olhos uma paisagem humana em que a monstruosidade e os desastres não eram de todo desaparecidos e as linhas do desenho surgiam deformadas e retorcidas. [...] A regra do senhor Palomar foi aos poucos se modificando: agora já desejava uma grande variedade de modelos, se possível transformáveis uns nos outros segundo um procedimento combinatório, para encontrar aquele que se adaptasse melhor a uma realidade que por sua vez fosse feita de tantas realidades distintas, no tempo e no espaço. [...] Analisa ndo assim as coisas, o modelo dos modelos almejado por Palomar deverá servir para obter modelos transparentes, diáfanos, sutis como teias de aranha; talvez até mesmo para dissolver os modelos, ou até mesmo para dissolver-se a si próprio.
Neste ponto só restava a Palomar apagar da mente os modelos e os modelos de modelos. Completado também esse passo, eis que ele se depara face a face com a realidade mal padronizável e não homogeneizável, formulando os seus “sins”, os seus “nãos”, os seus “mas”. Para fazer isto, melhor é que a mente permaneça desembaraçada, mobiliada apenas com a memória de fragmentos de experiências e de princípios subentendidos e não demonstráveis. Não é uma linha de conduta da qual possa extrair satisfações especiais, mas é a única que lhe parece praticável.

Refletindo sobre “O modelo dos modelos”
Sem que tenhamos consciência disso, agimos de determinada maneira que é estabelecida segundo padrões e convenções. Esperamos que todo ser humano tenha atitudes, ações e se comporte e reaja de forma mais ou menos previsível. É o que se observa na sala de aula, onde o professor se esforça para que todos atinjam o mesmo patamar e da mesma forma, seguindo as mesmas estratégias e as mesmas intervenções para todos. O professor espera e se decepciona quando a realidade lhe apresenta a necessidade de se estabelecer outros procedimentos, outras formas de pensar e agir.
A realidade atual, com o advento da inclusão, exige que as mentes estejam abertas ao novo e ao aprendizado. A postura e o que esperar tem de ser diferente. O AEE tem como objetivo favorecer para que esta postura vá se modificando, através do apoio e orientações necessárias para que alunos e professores do ensino regular consigam avanços e a superação de suas dificuldades. Para tanto é preciso conhecer as barreiras que impedem o desenvolvimento de cada aluno, as potencialidades que podem ser exploradas e os recursos pessoais e materiais que podem auxiliar nesse processo.

Mas mudar exige esforços, e mudanças mais profundas demandam maior esforço ainda, que deve acontecer em várias frentes. Estamos enfrentando resistências que são comuns em todo processo onde é necessário desconstruir para depois reconstruir. Essa reconstrução é de algo que não pode ser regido por regras, não possui padrões o que torna a construção ainda mais complicada. Como afirma o autor de “o modelo dos modelos”, não é uma construção da qual se possa extrair satisfações especiais, mas a única praticável. O começo costuma sim, ser permeado por conflitos, dificultando que se perceba alguma satisfação especial, mas vencidas as primeiras resistências, se tem aberto um canal para esta possibilidade.

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